Oito de Março e o mundo inteiro comemora o dia das mulheres. Não precisa falar o quanto a data é importante para todos os setores, e principalmente, como ela foi incorporada ao nosso dia-dia, tanto que é quase considerado um feriado, com direito a folga e tudo o mais. Porém, para além dos posts do Instagram e das promoções nas lojas de cosméticos, saibam que o dia das mulheres é uma data que não é apenas repleta de simbolismo, mas encabeça uma série de importantes lutas e conquistas do gênero!

Uma história a muitas mãos.

Poucas pessoas abordam sob tal perspectiva, mas a história do feminismo começa com uma inversão de papéis que se inicia antes mesmo da civilização ocidental existir. Isto pode, por exemplo, ser atestado, quando se analisam as primeiras representações de deuses da antiguidade pré-histórica. A predominância era das imagens das “musas”, que nada mais eram que representações do sagrado feminino a partir da fertilidade, do poder que as forças da natureza apresentam e da dependência do homem primitivo dela, já que se um determinado lugar é suscetível às intempéries naturais, há menos chances de haver condições para uma boa sobrevivência naquele local.

Contudo, o desenvolvimento de tecnologias (como o arco e a flecha, o domínio do fogo, etc.) fez com que a sociedade primitiva se reorganizasse. Em seu “A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado” (Post #1.046), Engels explica de maneira muito interessante, baseado em reminiscências familiares ainda existentes ao seu tempo, como a mulher perdeu espaço, na medida em que o homem torna a sociedade complexa, acumula bens e ssectariza todas as relaçõe sociais. Outros autores farão referência a esta movimentação simbólica da importância do pai para a família, o que mais tarde seria definido como o que hoje se conhece como “Patriarcado” (guardem bem estas palavras”.

O patriarcado não surge em um momento específico na história da humanidade. Como dito anteriormente, ele é o resultado de um movimento bastante paulatino, que tem como consequência a perda da influência feminina e do consequente aumento em importância do arquétipo masculino na sociedade. Para Kraemer, por exemplo, o patriarcado pode ter surgido por volta de 4.000 a.C, tendo se consolidado na formação de códigos legais. Cita como exemplo a Mesopotâmia como o berço desse tipo de expressão.

Pois bem. O problema com todo este processo é que a balaça ficou desigual: de um lado, os homens que tudo podiam – e espalhavam sua influência e patrimônio genético pelo mundo afora – e do outro, as mulheres se tornavam cada vez mais oprimidas, submissas e objetificadas. Na Grécia e em Roma, era incomum, por exemplo, a presença de mulheres na vida política de forma coadjuvante, embora os arquétipos e os ideais quase sempre fosssem representados sob imagem feminina. No Ocidente europeu, também as mulheres incorporavam o patrimônio do homem, a família, centralizada na figura do pai, era administrada, da porta para dentro, pela mãe, que, submissa, dava alento e prestava contas ao senhor, seu marido, do cotidiano da casa, numa atmosfera que era feito de forma a parecer menor e menos importante que o comércio, as finanças, a vida pública em geral. Não demorou e a Era Comum, a vida de homens e mulheres, quer nas cidades, quer no interior, era composta por dois universos em uma intersecção: coexistiam mas não se tocavam.

Uma mudança se inicia

O conceito de uma mulher independente, que é capaz de atuar em prol de si mesma e de contribuir com a sociedade em que vive, na verdade, nunca deixou de povoar o inconsciente coletivo. Mesmo quando houve o período de maior tensão social entre todos os gêneros, na Idade Média, havia mulheres, sobretudo nas igrejas e conventos, que tinham que dar o sangue para conquistar tanto quanto os homens, e muitas eram arrimo de família. Outras tantas desempenharam papéis relevantíssimos: foram rainhas, cientistas e até mesmo guerreiras, como o caso da santa francesa Joana D’Arc.

Todavia, tinha no background da história muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. E tudo só se tornou ainda mais intenso com o fim da Idade Média (com a queda de Constantinopla, em 1520), o renascimento e os avanços técnicos e científicos que vieram no pacote. Surgiram os primeiros bancos, a mecânica aplicada aos meios de produção enfraquecia paulatinamente as manufaturas e as cidades, que haviam perdido muito da sua importância, durante o surto de peste negra entre os anos de 1347 e 1351 em toda a Europa, começaram a se reerger. Aos poucos a mão de obra campestre começou a ser menos relevante e o surgimento de uma nova classe social se deu: a burguesia.

Os burgueses assim se denominavam porque eram, em sua maioria, antigos moradores dos burgos, as primeiras vilas fortificadas que, mais tarde, se tornariam cidades. Os burgueses se indispuseram com os nobres, dado que eles detinham o capital, já que especulavam (algo que a Igreja condenava) e tinham reservas vultosas nos recém criados bancos, enquanto os nobres os olhavam de cima pra baixo e faziam muxoxo da sua presença. Foi a indignação com a submissão aos nobres, entre outros, que inssulflou, no século XVIII a Revolução Francesa (1989-1799), que deu um fim aos regimes antigos, e, com eles também instaurou ideiais de democracia e equidade. Sob a máxima de “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, os franceses conseguiram limitar o poder dos governantes, e lançar os ideais de uma sociedade mais participativa.

As três fases do feminismo

E é aqui que entram as feministas na história. Com o aumento do estilo de vida cosmopolita, as mulheres precisavam, especialmente as que viviam em cidades, se engajar, trabalhar, viver suas vidas. Ocorre que no século XX, quando se deu a primeira fase do feminismo, a maioria das mulheres ainda se encontravam embevecidas com as conquistas dos iluministas, principalmente no campo democrático. Elas entenderam que, em um mundo masculino, a diplomacia somente faria efeito se realizada por meio da política. Portanto, era essencial que as mulheres pudessem também escolher suas representantes e, desta maneira, se tornarem detentoras de alguns poderes.

As primeiras feministas logo passaram a ser definidas a partir da causa que defendiam: o voto feminino. Eram as sufragistas (do termo sufrágio = voto). A verdade é que, embora a política fosse o principal objetivo, outros direitos civis também foram pleiteados, como por exemplo, o direito à propriedade, que se deu em 1809, no estado de Connecticut (EUA), o primeiro a reconhecer que as mulheres tinham, ao menos, o direito de ter propriedades. O voto feminino aos poucos se instaurou nos EUA e em várias partes do mundo.

A segunda onda do feminismo no Ocidente é como a consolidação da Pirâmide de Maslow da sociedade. Uma vez conquistados avanços no campo social, chegou a vez de questionar-se e à sociedade, pela liberdade da vivência do próprio corpo. Nos anos de 1960 e 1970 este movimento se tornou mais proeminente. As mulheres buscaram conquistar seus direitos sobre a sexualidade, família, mercado de trabalho (e como entrar nele) bem como a equalização dos direitos de homens e mulheres, tanto no uso e costume, quanto na elaboração de leis. As mulheres queriam autonomia e queriam também ser vistas.

A liberação sexual é uma pauta muito frequente quando se remete a este período. E não por acaso. A mídia de consumo popular focou, principalmente na música, na temática do amor livre e da paz (“make love, not war”) como parte desta nova era, que repercutiu em diversos aspectos. Logo em seguida, os experimentos e o desenvolvimento das pílulas anticoncepcionais deu à mulher a liberdade de decidir quando e se terá uma família. O mercado de trabalho também começou a se abrir para as mulheres e enfim os discursos sobre gênero passaram a ser mediados por conquistas e reivindicações com mais voz, já que a conquista do voto permitiu a eleição, por mulheres, de várias representantes legítimas comprometidas com a causa.

A terceira onda, que teria surgido nos anos de 1990, trouxe um questionamento e o reconhecimento dos marcos anteriores. No entanto, as feministas deste período – que, aliás, segue até os dias atuais – buscaram criticar o feminismo que divide as mulheres e que ignora as minorias femininas, como as mulheres negras, trans, que vivem em outros continentes e que ainda lutam por direitos primitivos do movimento.

As pautas deste período são mais fluidas, mas têm uma maior amplitude, na medida em que são propagadas, principalmente, pelo meio virtual, em plataformas como Youtube, Twitter, Facebook e Instagram, por exemplo. Nomes como Chimamanda Ngozi Adichie, autora e feminista africana, Bell Hooks, feminista e autora americana, entre outros, tentam traduzir a demanda feminista para outros nichos, em outros níveis e expressões.

Para saber mais

Por fim, o feminismo ainda não se deu por satisfeito. E esta abordagem, mesmo comprida, ainda está muito longe de compreender todas as nuances, os enormes feitos e as contribuições do feminismo para todas as mulheres pelo mundo. No entanto, aqui no BLG, temos uma seção só pra ajudar nosso leitor a aumentar o conhecimento sobre a causa por meio do termo feminismo. No entanto, como hoje é uma data super especial, selecionamos cinco livros que são essenciais para quem deseja saber mais sobre o tema em todas as suas fases.

Cada livro traz o melhor de cada autor. Você pode pesquisar eles ou simplesmente clicar na nossa lista. A escolha desta seleção foi:

  • 1.041 – Simone de Beauvoir – O Segundo Sexo (2009) – uma obra poderosíssima, escrita no fim da primeira fase do feminismo, mas que se traduz também como uma obra transicional. Ela é extremamente importante porque lança os fundamentos da feminilidade e do papel da mulher como uma construção nem sempre pacífica.
  • 1.042 – Naomi Wolf – O Mito da Beleza (1992) – nesta obra nunca se questionou tanto aquilo que mais se enaltece na mulher: a beleza. E com ela, a discussão sobre como tal conceito se tornou, ao mesmo tempo que uma dádiva, uma prisão e uma obsessão impulsionada pelo desejo patriarcal de posse e de ostentação.
  • 1.043 – Maria da Penha – Sobrevivi… Posso Contar a Minha História (2010) – a história de uma mulher que viu – e sentiu – como a ausência de leis de proteção à mulher pode ser uma armadilha de potencial real para causar danos irreversíveis. Um relato forte e sensível da condição da mais proeminente feminista brasileira.
  • 1.044 – Djamila Ribeiro – Quem Tem Medo do Feminismo Negro? (2018) – as vozes negras não são feministas? Djamila Ribeiro questiona a predominância de vozes brancas no discurso feminista e quebra a percepção de como o feminismo atinge mulheres brancas e mulheres negras, aventando a necessidade de mais inclusão étnica no debate feminista.
  • 1.045 – Betty Friedan – A Mística Feminina (1971) – a busca pelo papel da mulher no mundo e os tropeços que o gênero enfrenta são a temática deste livro que é considerado um clássico da segunda onda feminista, no qual os valores sao postos em jogo para um melhor desenvolvimento da imagem da mulher a partir do seu questionamento.

Super comprido esta reportagem especial, não foi mesmo? Então não esquece de comentar se você tem alguma informação adicional, sugerir novos título para expandir a nosssa conversa, e, claro, se puder, colaborar com o nosso blog por meio de alguma das formas na nossa página de doações.

Vejo vocês no próximo post. Até lá.

Ricardo S.


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